A profissão do professor é cheia de altos e baixos. Bem, nas atuais condições de (des) valorização pelas quais a Educação passa, é possível dizer que são mais baixos do que altos. Entretanto, ainda é possível tirar bons momentos. Eu gosto de ser professora porque todos os dias algo novo acontece. A macro-rotina é a mesma: acordar cedo, pegar trânsito, carregar uma mochila pesada cheia de livros, entrar em aula, pedir silêncio, fazer chamada, pedir silêncio explicar conteúdo, pedir silêncio, dar exercícios, pedir silêncio. A questão é que todo dia alguma coisa diferente acontece, alguém fala algo muito engraçado, ou muito tosco digno de parar a aula pra debater aquele assunto, e por aí vai.
Esse ano eu tenho um aluno de 8 anos que é muito particular. Sim, uma criança de 8 anos é capaz de me causar arrepios todas
as segundas e risadas fantásticas todas as quartas, ou vice-versa. E ele merece uma crônica especial pelo simples fato de me desafiar todas as segundas e quartas enquanto
ser humano e enquanto professora.
Em anos de profissão, ele foi (é, será?) a única criança que eu
tenho vontade de sufocar com um travesseiro na cabeça e ao mesmo tempo ele é o
único que surge com sacadas tão geniais que salvariam a cabeça dele em caso de
emergência.
Uma vez ele tentou me desconcertar na frente de 3 turmas.
Estávamos todos assistindo a um vídeo e eu estava conduzindo a aula. De repente
ele levantou e gritou:
- I hate teacher Bianca!!!!!!!!!
Todos ficamos olhando pra ele sem entender muito bem o que
se passava. Confesso que nem eu mesma sabia o que fazer, pois me faltava
experiência, traquejo e outras coisas mais. Juntei coragem contra o moleque
desafiador e perguntei:
- Pronto? Já disse o que queria? Precisa acrescentar mais
alguma coisa?
Ai ele ficou sem graça e disse que não. Sentou no seu cantinho, bem amuado e não incomodou mais. Acho que ali ele queria deixar bem
claro que não tava nem um pouco satisfeito com a Teacher Bianca e parecia que
ninguém mais estava entendendo, então ele precisava contar de alguma forma.
Outra dia, ele me surpreendeu com um desenho. A
atividade consistia em desenhar roupinhas nos bonequinhos do livro. Além das
roupinhas “normais” ele fez uma sombra na região da boca da bonequinha Sally. Eu
perguntei se aquilo era uma barba, não criminalizando se fosse, mas já
imaginando que ele transformaria a personagem-menina em menino pela falta de
representatividade. Qual não foi minha surpresa quando ele disse que aquela
sombra era na verdade uma máscara de ninja! Achei muito bom: empoderou uma
personagem feminina, sem exaltar as
qualidades sexuais e etc. É claro que ele é apenas uma criança, mas tanto
melhor. Como disse, quase não tem representatividade feminina no universo dos
quadrinhos, dos filmes, etc.. Até mesmo as meninas desenham personagens masculinos sempre que eu peço algo diferente. Então, o fato dele ter feito uma personagem ninja foi surpreendente.
Semana passada, ele chegou com conjuntivite na sala de aula. Eu olhei pra ele e fiquei pensando: SÉRIO? É SÉRIO QUE ATÉ COM CONJUNTIVITE VOCÊ VAI VIR PRA AULA? Sou capaz até de imaginar que ele foi pra aula com conjuntivite pra me passar, porque diferentemente das outras aulas, ele ficava me chamando muito na mesa dele, querendo mostrar os desenhos e fazer perguntas. Eu me aviso constantemente: toda atenção é pouca para com esse garoto.
E assim correu um ano de convívio com esse menino. Toda segunda e quarta ele vem com alguma coisa nova. Às vezes é genial, às vezes muito agressivo, nunca meio termo, nunca no nível de uma criança normal. Todo domingo e terça eu me pego pensando: o que será que ele vai fazer amanhã?
Semana passada, ele chegou com conjuntivite na sala de aula. Eu olhei pra ele e fiquei pensando: SÉRIO? É SÉRIO QUE ATÉ COM CONJUNTIVITE VOCÊ VAI VIR PRA AULA? Sou capaz até de imaginar que ele foi pra aula com conjuntivite pra me passar, porque diferentemente das outras aulas, ele ficava me chamando muito na mesa dele, querendo mostrar os desenhos e fazer perguntas. Eu me aviso constantemente: toda atenção é pouca para com esse garoto.